Uma situação que, por vezes, é verificada no âmbito das disputas por heranças é a necessidade de serem prestadas contas do patrimônio do falecido, quando esse tinha seus bens administrados por terceiros.
É o caso de pessoas que, nos últimos anos de suas vidas, têm seus bens administrados por terceiros, geralmente um parente, o qual, por meio de uma procuração, passa a gerir os bens e rendas de alguém que tem idade avançada ou está acometido de alguma enfermidade.
Em muito casos, inclusive, o autor da herança é interditado por meio de curatela e o curador, normalmente um parente próximo, passa a gerir o patrimônio daquele que vem a ser declarado incapaz.
Com o falecimento daquele que tinha seu patrimônio gerido por terceiro, surge o interesse dos herdeiros em saber as contas do período em que o patrimônio foi movimentado com base em mandato ou curatela, uma vez que, durante esse período, bens e valores podem ter sido subtraídos de modo ilegal.
Caso emblemático foi julgado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no último mês de março, em processo no qual a defesa dos interesses dos herdeiros prejudicados foi realizada por SANTOS DE BARROS ADVOCACIA E CONSULTORIA JURÍDICA.
Com relatoria da Ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Espírito Santo que condenou mandatárias e curadora (que também eram herdeiras) a prestarem contas dos valores subtraídos do patrimônio da falecida Sra. Henedina Rocha Calmon.
Dona Henedina Rocha Calmon foi a única herdeira do empresário e industrial brasileiro Eudóxio Calmon – criador, dentre outros, da marca e produto Cremogema.
Após o falecimento do Sr. Eudóxio, alguns dos herdeiros colaterais de Dona Henedina passaram a gerir seu patrimônio, realizando diversas doações em favor próprio e realizando saques e transferências de contas correntes sem qualquer justificativa.
Posteriormente, esses mesmos herdeiros, réus na ação, interditaram Dona Henedina e, com base na curatela, continuaram a usar o patrimônio da incapaz.
Seja em relação ao período em que o patrimônio foi gerido por meio de procuração, seja em relação ao período posterior no qual houve curatela, nunca foi realizada prestação de contas a respeito da movimentação dos bens e valores.
Após o falecimento de Dona Henedina, outros herdeiros colateriais, que não participaram da gestão do patrimônio dela, ajuizaram Ação de Prestação de Contas contra aqueles que se beneficiaram das doações realizadas com o patrimônio da mandante/curatelada, bem como contra aqueles que geriram os bens e rendas com base em procuração e, posteriormente, com base em curatela.
O Tribunal de Justiça do Espirito Santo julgou procedentes os pedidos para determinar que todos os réus prestem contas do patrimônio gerido, tanto em relação ao período de mandato, quanto em relação ao período da curatela e, ainda, em relação àqueles beneficiários que receberam doações oriundas do patrimônio da mandante/curatelada.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, com voto condutor da Min. Nancy Andrighi, manteve a condenação, afirmando a legitimidade não só daquelas pessoas que atuaram como procuradores e curador de Dona Henedina, mas, também, em relação àqueles que se beneficiaram das doações realizadas com o patrimônio que deveria ter sido administrado em favor da mandante/curatelada.
Uma vez que o mandato e a curatela devem ser exercidos em benefício do mandante e do curatelado, atos praticados fora desse propósito são nulos, daí a necessidade de serem prestadas as contas para que se possa saber quais atos deverão ser passíveis de nulidade. Não pode o procurador usar o instrumento de mandato em benefício próprio, nem o curador tomar para si o patrimônio do incapaz.
O Superior Tribunal de Justiça também reconheceu a possibilidade de sucessão processual em relação àqueles réus da ação de prestação de contas que vieram a falecer no curso do processo, devendo os espólios e herdeiros destes prestarem contas do patrimônio recebido ou gerido pelo réu falecido.
Cabe transcrever os seguintes trechos do voto condutor do julgado:
…