Uma postura inconstitucional tem sido adotada pelo Poder Executivo da União no que concerne à aplicação do “abate-teto” sobre os rendimentos dos servidores públicos federais.
O Poder Executivo Federal, tendo por base orientação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG -, tem entendido que o rendimento da pensão por morte deve ser somado com outros rendimentos do servidor beneficiário da pensão para fins de aplicação do teto remuneratório previsto no art. 37, XI, da Constituição da República (o qual corresponde ao valor do subsídio mensal de Ministro do STF).
Assim, se um servidor recebe sua remuneração pelo cargo que atualmente exerce ou recebe seus proventos de aposentadoria pelo cargo que exerceu e, também, recebe uma pensão por morte deixada pelo seu falecido cônjuge ou pelo seu falecido genitor/genitora (nos casos em que a legislação permite a concessão de pensão para os filhos), o Poder Executivo da União soma os dois rendimentos (remuneração/proventos com a pensão por morte) e, sobre a soma, aplica o “abate-teto”, descontando o valor que ultrapasse o subsídio mensal de Ministro do Supremo Tribunal Federal.
Com essa interpretação, a União acaba extinguindo o direito ao percebimento da pensão por morte para aqueles beneficiários que já tenham remuneração ou proventos de aposentadoria em valor próximo ao de um subsídio de Ministro do STF.
Essa interpretação da União faz com que um funcionário público, que tenha boa remuneração, casado com quem também seja funcionário público, no caso de falecimento deste, não venha a perceber nada ou quase nada a título de pensão por morte, uma vez que o “abate-teto” retirará a quase totalidade do valor benefício previdenciário.
Imaginemos um casal, ambos servidores públicos, cada um com remuneração equivalente a 80% do subsídio mensal de um ministro do STF, logo, nenhum deles sofre desconto de abate-teto em suas respectivas remunerações. Mas, diante do falecimento de um dos cônjuges, aquele que sobreviver apenas irá receber a título de pensão por morte o valor que faltar para atingir o subsídio de um Ministro do STF, sendo todo o restante retido pela União a título de “abate-teto”.
Imaginemos, ainda, que esse casal tenha dois filhos, a renda familiar contava com duas remunerações de 80% do subsídio de Ministro do STF e, com a morte de um dos cônjuges, a renda familiar estará limitada a uma remuneração de Ministro do STF, implicando efetivo prejuízo à subsistência do núcleo familiar.
Mais simples ainda, no caso de um Ministro do STF que seja casado com uma servidora pública, diante do falecimento desta, de acordo com o entendimento do MPOG, o Ministro não terá direito ao recebimento de qualquer valor a título de pensão por morte, uma vez que o valor do benefício previdenciário será integralmente descontado a título de “abate-teto”.
O TCU já afirmou que o teto remuneratório, no caso da pensão por morte, deve ser calculado isoladamente, não devendo haver a soma com outros rendimentos que sejam próprios do beneficiário da pensão.
Possuindo os rendimentos instituidores distintos, não deve haver a soma para cálculo do “abate-teto”.
Administrativamente, o CNJ tem entendimento idêntico ao do TCU e no âmbito do Ministério Público e do Poder Legislativo também não tem sido aplicado esse abusivo entendimento do MPOG, dessa forma, tal problema tem afligido apenas os servidores do Poder Executivo ou aqueles que são servidores de outros Poderes, mas recebem pensão por morte paga pelo Poder Executivo.
Em processo ajuizado e acompanhado por SANTOS DE BARROS ADVOCACIA E CONSULTORIA JURÍDICA, o Juízo da 16ª Vara Federal de Brasília deferiu liminar e, posteriormente, proferiu sentença de procedência para determinar que a União deixe de calcular o “abate-teto” considerando a soma dos rendimentos de aposentadoria percebidos por Auditora Fiscal da Receita Federal com a pensão de montepio civil deixada por seu falecido pai.
Dentre os fundamentos da sentença de procedência, o Juiz Federal Marcelo Rebello Pinheiro consignou:
(…) no caso de percepção cumulativa de subsídios, remuneração ou proventos, juntamente com pensão decorrente de falecimento de cônjuge ou companheiro (a) (na hipótese, em analogia, o montepio civil facultativo), o limite fixado na Constituição Federal como teto remuneratório deve ser considerado individualmente, e não em conjunto.
…
o próprio Tribunal de Contas da União (…) já se pronunciou acerca do assunto aqui tratado (…) Entendeu o TCU que o teto constitucional aplica-se à soma dos valores percebidos pelos instituidores individualmente, de modo que não incide o teto constitucional sobre o montante resultante da acumulação de benefício de pensão com remuneração de cargo efetivo ou em comissão.
Assim, a postura da União no cálculo do “abate-teto” é inconstitucional e desrespeita acórdão do Tribunal de Contas da União, devendo os interessados adotar as medidas judiciais cabíveis para ver afastado o cálculo do teto remuneratório sobre a soma da pensão por morte com outros rendimentos que sejam próprios do beneficiário da pensão.